quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Filosofia de Moska


Foto: Ederclinger Melo Reis
Edição: Ederclinger Melo Reis e Germana Cleia da Silva
Texto de abertura: Ederclinger Melo Reis e Germana Cleia da Silva


O apelido é a sua assinatura. Aos 41 anos, o cantor Moska, coleciona oito discos na carreira solo, sete “modestas” participações em filmes (como ele próprio fala) entre outros trabalhos como ator em mini-séries e espetáculos teatrais.

Historicamente, Paulo Correia de Araújo é considerado pelos críticos como uma pessoa que passou por várias transformações: começou no grupo Garganta Profunda, foi para o “Inimigos do Reis”. Deixou de ser Paulinho Moska para ficar com o segundo nome, quando lançou o álbum ‘Eu Falso da Minha Vida o que Eu Quiser’, em 2001, num momento difícil de sua vida o qual ele não quis revelar. Isso até chegar no “Tudo Novo de Novo”, transformando a dor em amor.

Atualmente, paralelo à sua carreira no estúdio e no palco, Moska atua como apresentador e cantor no programa televisivo de entrevistas e músicas “Zoombido – A Canção de Todo Mundo”, do Canal Brasil. Ele vive um momento de alegria, segundo o próprio, com o seu novo disco “Mais Novo de Novo”, mas ainda com sua marca do que ele chama de “melancoliberdade”.

A seguir, Moska mostra sua faceta filosófica e “metamorfósica” da carreira já consagrada do cenário nacional da música popular brasileira. O carioca revela suas idéias e experiências, em especial no álbum totalmente independente ‘Tudo Novo de Novo’, quando fotografava seu próprio reflexo em objetos espelhados nos hotéis por onde passava.

O camarim do BNB Clube serviu de sala de espera para que esta entrevista fosse realizada. Esperamos aproximadamente três horas até que Moska passasse o som e nos atendesse. Ele vestia uma calça camuflada modelo exército, uma camiseta branca com o desenho de cara engraçada e os dizeres: “This was my face before surgery” [Esta era a minha cara antes da cirurgia], sapato Cross, meias brancas com detalhes de flores e chapéu xadrez. Simpático, Moska apresentou, na maioria do tempo, inquietação, cruzava e descruzava as pernas e mãos.

No final da entrevista, pedimos que ele se fotografasse no reflexo do espelho, provocando nele o sentimento de voltar aos velhos e bons tempos em que ele fazia tal atividade.

Ao ser indagado sobre seu novo estado de ser, depois de grandes transformações na sua trajetória, apesar de se esquivar e se acomodar melhor na poltrona, ele filosofa.

Eder e Germana: Você considera que o Álbum ‘Tudo Novo de Novo’ se tornou uma transformação na sua vida? Você utilizou as fotografias que fazia do seu reflexo em hotéis nos quais ficava hospedado. Como foi?
Moska: Primeira coisa que eu já consegui foi fugir do banheiro, consegui escapar do banheiro. Eu já não faço mais fotografias de hotéis, porque justamente já fiz 4 mil, em três anos e fiz outras 3 mil em homenagem a elas. Dei nomes para as que eu mais gostava e depois escrevi poemas para os nomes e depois as canções para os nomes. Foi um processo que não foi pensado. Eu comecei a fazer as fotos sem saber o porquê de estar fazendo. E aos poucos me vi com uma quantidade enorme e uma pressão de fazer alguma coisa para aquilo, antes que eu enlouquecesse.

Eder e Germana: E como foi a primeira?
Moska: A primeira foi em Nova Iorque, três dias antes dos ataques terroristas [ele se refere ao atentado, no dia 11 de setembro de 2001, ao Word Trade Center]. Comprei essa câmera digital e estava com o manual no hotel e havia um botão chamado ‘micro’ para fotografar coisas mais pequenas e eu saí experimentando este botão pra testar a câmera. Procurei um objeto pequeno e vi o meu reflexo na maçaneta, não numa torneira de metal. Comecei a fotografar muito mal, na verdade. Estas primeiras são muito feias. Não feias, mas não cheguei a uma qualidade que ela não tem.

Eder e Germana: Qual lhe chamou mais atenção?
Moska: Na verdade a primeira que me chamou atenção foi por volta de 1500. Eu jogava no computador e deixava lá. E um dia no Japão, em 2001 eu tirei um foto com numa torneira que tinha um diamante em cima, uma imitação de diamante para abrir e fechar a água da torneira. Botei meus olhos onde caía água e dei um nome para esta foto, chama-se ‘Lágrimas de Diamantes’.

Eder e Germana: Você fez alguma homenagem também a essa foto?
Moska: Uns três meses depois eu estava indo para a Chapada Diamantina fazer um show e justamente lembrei, por causa do Diamante, do nome Diamantina e comecei a fazer uma letra lembrando da foto. Depois quando cheguei em casa peguei a letra e fiz a música e dei o nome da música de ‘Lágrimas de Diamantes’. Descobri o que fazer com as fotos. Passei então a fotografar buscando uma imagem que me sugerisse um nome para escrever um poema e fazer uma canção.

Eder e Germana: Houve algum momento em que você tirasse a foto só depois de compor uma música?
Moska: No meio do processo, eu inverti também: fazia uma música e depois tirava foto, buscava um nome através da foto, enfim o processo se misturou e a partir de um certo momento sabia que estava fazendo um disco, que era um processo fechado que juntava imagem com palavra e música. Passei a dirigir um novo álbum que nasceu natural, que acho que é o melhor caminho que você faz uma obra. Tenho fruição, que eu te falei: deixa rolar e depois uma certa manipulação, você se institui com aquilo, começa a organizar ou ter umas idéias meio malucas. Lembro-me que algumas fotos tinham flores desenhadas nuns azulejos que ficavam por trás dos objetos que eu fotografava como se fosse um cenário. Então essas que tinham flores eu também separava numa pasta especial e dei um nome pra esta pasta: ‘Jardim do Silêncio’, que leva ou a escrever a letra e depois a música. Então todo o repertório foi feito em cima dessas fotografias, enfim, toda a imagem na luz que tem a fotografia misturada com a idéia de aurora em relação ao crepúsculo do falso.

Eder e Germana: Qual foi o sentido desta experiência para você?
Moska: Foi um caminho delicioso mesmo, como uma libertação desse repertório de escuro, que tinha uma esperança e uma alegria bem distinta. Posso dizer que estou gravando um álbum novo que é mais feliz ainda que o ‘Tudo Novo de Novo’ [ele se refere ao disco que está em estúdio] sem deixar de ser melancólico, que é a minha assinatura também: chamo de ‘melancoliberdade’. Na verdade não é uma tristeza, eu sou uma pessoa muito feliz, só trabalho com a melancolia. Mas esse trabalho me dá uma felicidade enorme, então, eu já chamo de ‘Melancoliberdade’.

Eder e Germana: Conte um pouco mais desta sua nova fase? Isso faz parte de uma das suas tantas transformações?
Moska: É o meu primeiro disco independente, completamente independente. Uma das coisas que mais tem me agradado nessa fase independente é que não tenho mais data para nada. Eu fui contratado de uma multinacional por treze anos, o que tinha data pra tudo, não é? Eu tinha data para entregar repertório, data para entrar no estúdio, data para terminar o disco, data para mandar para a fábrica, data para lançamento e data para fazer sucesso. Hoje, eu me libertei disso, não tem data mais para nada e produzo. Depois que está pronto, vejo como é que vai sair, por onde vai sair ou como. Virei realmente o dono da minha carreira.

Eder e Germana: E como é o seu dia-a-dia de músico?
Moska: Estou gravando de uma maneira muito diferente que sempre gravei. Eu não entrei no estúdio nem me internei no estúdio. Não entrei para gravar e é a primeira vez que eu faço assim: gravo um pouco e levo pra casa, uma semana depois gravo mais um pouco, levo para casa, duas semanas depois gravo mais um pouco. Não estou fazendo comigo o que fizeram quatro anos. Estou aproveitando esta liberdade para transformá-la em qualidade e tranqüilidade.

Eder e Germana: Quem é Paulinho Moska, hoje?
Moska: Quem sou eu? Não sei. Costumo dizer que eu espero da minha vida o que eu seja diferente de ontem e de amanhã, que o tempo presente que eu habite, seja sempre novo pra mim: é o que eu busco. Não estou falando isso porque trabalho com arte: acho que todo mundo é artista, todo mundo tem potencial pra criar e esse potencial vem justamente do tempo, que faz com que não sejamos os mesmos a cada segundo. Então, acho que isso vem do meu entendimento muito particular de que a vida é uma grande mutação constante. Não estou te criticando, só estou respondendo à tua pergunta: essa pergunta, eu acho, é meio descabida para mim [ele se levanta para sentar mais confortavelmente na poltrona], eu não consigo responder algo que não está parado, eu não consigo explicar algo que está em movimento, o movimento é justamente a possibilidade de a gente não se tornar sedentário, é o movimento que faz com que o espírito seja nômade, seja livre e isso se manifesta no presente porque o passado não muda e o futuro a gente não sabe qual é, então, o presente é o lugar onde as coisas acontecem, onde está tudo em movimento. Quem eu sou? Eu sou este tempo presente.

Nenhum comentário: